quarta-feira, 25 de abril de 2018

Estou com câncer! E agora?


Quando você recebe um diagnóstico ruim, inesperado, como o de um câncer, apesar da situação ser totalmente adversa, e você sentir um medo absurdo, há, no meio desse turbilhão de emoções, algo que acontece com você que você nunca tinha se dado conta: existe algo positivo em tudo. Faz dois dias que recebi o diagnóstico: "carcinoma ductal invasivo Grau I - estágio nuclear II". E em apenas dois dias tudo o que eu acreditava e pensava sobre todas as coisas ganhou um novo significado.
Em dois dias posso dizer que senti todas as coisas que alguém pode experimentar: medo, tristeza, preocupação, raiva, amor, angústia, confiança, fé, alívio, força, coragem, solidão, apoio, solidariedade, empatia, sensibilidade à flor da pele, abandono, decepção, acolhimento, uma calma inexplicável, seguida de uma terrível crise de ansiedade... Passei por tudo isso e nunca, em toda minha vida, senti tanto medo e tanta vontade de viver.
Quando aquilo que você mais teme acontece, algo muda completamente em você. Foram oito dias de espera pelo resultado da biópsia. A angústia da espera e a tortura de não saber é tão grande que quando você finalmente recebe o diagnóstico o que você sente imediatamente é alívio! Nunca imaginei que seria assim, mas o que eu senti no exato momento em que descobri que estava com câncer foi alívio. A tortura acabou e agora eu já posso me concentrar na minha cura. Eu descobri que o meu medo me empurra, me dá uma coragem que eu nem sabia que tinha. Eu tenho pressa!
Eu descobri o nódulo no meu seio esquerdo há 20 dias. Assim que senti aquele caroço estranho no meu corpo, antes mesmo de comentar com alguém, eu corri para o computador e marquei uma consulta para a primeira hora disponível da médica. Nesse dia eu comecei a descobrir o poder do amor e da amizade. Comentei primeiro com o Diego - que imediatamente me acolheu e disse que estaria comigo em qualquer situação - e depois contei para algumas pessoas próximas e quando falei com a minha amiga Cristiane, ela largou imediatamente o que estava fazendo e veio até a mim. Depois disso não ficou mais um único dia sem me procurar e me dar a coragem que eu iria precisar.
Dias depois fiz a mamografia (que não apareceu nada) e no mesmo dia um ultrassom com um birads 4 - eu tinha um nódulo sólido, com 2cm, vascularizado e a possibilidade de ser maligno. Acho que esse foi o pior momento. Nunca tinha me sentido tão só.
Não consegui dormir naquela noite. Era tarde e eu não queria dizer para o meu marido e o meu filho o pavor que eu estava sentindo. Eu não podia fazer isso com eles. Queria ligar para alguém, queria chorar como um bebê, nunca precisei tanto de um colo, de ouvir de alguém querido, que tudo ia ficar bem. Mas eu estava absurdamente sozinha naquele momento. Essa era uma situação em que eu teria sido acolhida pelo meu avô, minha avó ou a minha tia Isa. Eu teria chorado no colo deles até me sentir segura de novo, mas eu não tinha mais nenhuma dessas opções: meu avô e minha tia não estão mais aqui e a minha avó está com 87 anos, muito doente e frágil eu não poderia fazer isso com ela também. Fiquei ali, no chão, em posição fetal chorando baixinho como nunca havia chorado antes. Foi nesse momento, aos 46 anos de idade, que finalmente eu amadureci e entendi que algumas situações você vai ter que encarar sozinha. Depois consegui ligar para algumas pessoas em quem eu acreditava que podia confiar, nem me dei conta de que eram quase duas da manhã. Quem me atendeu foi a Bia e depois a minha prima Thaís. Choramos juntas, nos consolamos juntas, esperamos juntas e depois nos fortalecemos juntas.
Nesses dois últimos dias, algumas coisas mudaram completamente em mim e coisas que antes importavam tanto perderam completamente o sentido. E o que mais me surpreendeu foi perceber - analisando friamente - que pouca coisa, ou melhor poucas pessoas realmente me prendem aqui. Eu simplesmente não estou pronta para ir embora porque eu preciso criar o meu filho que acabou de fazer 5 anos; porque quero ver a minha filha realizando os sonhos dela e porque quero viver ainda todos os sonhos que o Diego e eu sonhamos juntos nesses nove anos. Eu me despediria com saudades de muitos amigos, familiares e pessoas queridas. São muitas mesmo, mas acho que estaria pronta para dizer até logo a todos eles - porque eu realmente acredito em um até logo, mas ainda não poderia dizer isso a esses três. Não ainda.
E percebi que não tenho medo de morrer, isso foi o que mais me espantou. A vida não ficaria me devendo nada, nadinha! Mas, eu simplesmente ainda preciso estar aqui ao lado do Diego, do Tomás e da Bia. Eles precisam de mim e eu deles. Ainda temos muito para fazer juntos.
Dentro desse emaranhado de sentimentos, descobri que o câncer - entre tantas coisas - também veio me curar de muitas formas. Mágoas, ressentimentos e rancor podem sim ajudar causar câncer. Eu tive a certeza disso, no dia que chorei tão profundamente decepcionada e magoada e imediatamente o meu nódulo (só ele) começou a doer, arder e latejar. Foi ai que comecei a entender tudo. As minhas mágoas podem ter ajudado me causar esse câncer e entendi que agora só eu posso me livrar dele.
Descobrir que você tem um câncer faz você perceber o que realmente importa e o que você está fazendo de errado. Eu precisei chegar até as últimas consequências para entender isso e descobri que me curar definitivamente depende exclusivamente de mim. E comecei a trabalhar a meu favor assim que descobri o nódulo. Corri para Internet e pesquisei: "qual a alimentação adequada para quem está em tratamento de câncer?" Isso chocou o Diego, mas eu disse à ele que precisava estar preparada também para o pior e começar já a trabalhar a meu favor. Se não fosse nada, mal nenhum me faria uma alimentação super saudável.
O que eu já descobri em apenas dois dias diagnosticada com câncer:
1 - Você vai se surpreender de várias formas: consigo mesmo e principalmente com as pessoas. Vai descobrir que quem você acreditava que correria para te acolher não vai fazer isso. E aquela pessoa que você nem era íntima, que faz tão pouco tempo que você conhece, vai te dar o abraço que você precisa;
2- NUNCA, nunca, nunca, confie só na mamografia (eu faço uma vez por ano e nem na última que fiz no dia 24/03/18 - mesmo tendo um nódulo de 2 cm apalpável - ele não apareceu na mamografia e sai da sala com um laudo de birads 2 - escrito: não há evidência de nódulos). Faça a mamografia (porque tem nódulos que só aparecem na mamografia), mas não deixe NUNCA de fazer junto um ULTRASSOM (porque tem nódulos que só aparecem no ultrassom). Se eu tivesse feito um ultrassom à um ano, talvez teria pegado o câncer bem no início;
3 - EMAGREÇA! Eu só consegui perceber o nódulo, depois de ter emagrecido 5 quilos, depois de ter voltado a correr (pra valer) e voltar a me alimentar corretamente. A gordura que estava acumulada nos meus seios impediram a identificação do nódulo, mesmo fazendo o autoexame com certa frequência.
4 - Selecione muito bem as primeiras pessoas para quem você vai contar (antes de aceitar seu diagnóstico e entender direito o que está acontecendo). Vai ter aqueles momentos que você não vai querer conversar. Vão te encher de perguntas para as quais você ainda não tem respostas ou dizer coisas que vão te deixar triste ou te assustar, como por exemplo: "Vai se tratar NO SUS!!!?? Você vai entrar numa fila gigantesca, é demorado etc etc" Coisas que definitivamente você não precisa ouvir e que NÃO É VERDADE! O Tratamento do câncer é garantido por LEI e o Estado tem até no máximo 20 dias para te arrumar vaga no oncologista e se o seu câncer for INVASIVO (como o meu) o prazo é de 10 dias. Quando você estiver pronto conte para todos de uma única vez. Isso vai evitar o desgaste de ficar toda hora repetindo a mesma história;
5 - Você não é eterno, a vida é efêmera e a gente vive como se nada pudesse nos atingir. Nos sentimos, sei lá, super poderosos. Achamos que nada vai nos pegar e quando atinge você se dá conta de que passou boa parte da sua vida se importando com coisas absolutamente desnecessárias;
6 - Você vai descobrir que o tempo e distância não acabam com a amizade verdadeira e que o amor da sua vida vai estar do seu lado e que não importa o que acontecer ele vai estar lá. Vai descobrir que é amada de verdade e que mesmo que não esteja mais inteira... ele vai continuar do teu lado te amando como sempre. De todos os abraços que o Diego já me deu, aquele na madrugada no meio de uma terrível crise de pânico me deu imediatamente a paz e calma que eu precisava;
7 - Você descobre que é muito mais forte do que imagina e que por mais que alguém te ame e te apoie, essa batalha é só SUA. Ninguém vai poder te tirar dessa situação a não ser você mesmo.
8 - A sua intuição não falha! A gente é que não presta atenção nela. Quando descobri o nódulo, a primeira vez que toquei nele, senti um gelo na barriga. Eu soube naquele instante (por mais que tentasse me convencer do contrário) que eu estava com câncer;
9 - O câncer vai te devolver pessoas que tinham ido embora "para sempre" da sua vida - e essa é uma das curas que o câncer faz em você. Você vai receber o abraço e apoio de quem te ama de verdade, mesmo que esteja brigado com você. E nem posso te dizer a alegria indescritível que foi ouvir do meu irmão que ele me ama e que, mesmo sem nos falarmos, ele continuava lá me amando e eu amando ele.
10 - Você vai descobrir porque a vida te colocou em certos lugares e porque conheceu determinadas pessoas ao longo da sua vida - são elas que agora irão abrir as portas do caminho para sua cura. Ter tido um transtorno de ansiedade - que me faz fazer terapia, no posto de saúde ao lado de casa, a quase 4 anos - me fez conhecer as pessoas que eu iria precisar agora. Aquilo que parecia ser um mal tão grande (as crises de pânico e ansiedade) foi o que me fez fazer amigos, que hoje estão correndo para me amparar e me ajudar dentro do sistema de saúde. Eu descobri um nódulo no meu seio há menos de um mês, mas já estou agendada num oncologista e recebendo (dos amigos médicos que fiz no posto) as orientações para estar preparada para a minha cirurgia. Nunca imaginei que a minha corrida para a cura seria assim tão rápida!
A minha jornada está apenas começando. Sei que vem um caminho bastante turbulento pela frente. Mas estou preparada para enfrentá-lo. Não tenho medo do percurso porque sei (olha a intuição aí de novo) que vou sair vitoriosa dessa luta. Eu não sei ainda direito o que me espera pela frente (qual a gravidade total da situação), mas a única coisa que eu sei e sinto é que eu vou viver! Vou criar o meu filho, ver a minha filha realizando os sonhos dela e realizar os meus junto do Diego. E vou rir muito ainda com os amigos e familiares queridos.
Orem por mim!
Vibrem por mim!
Mandem as suas boas energias!
*Por que escrevi isso tudo? Porque eu sou escritora, oras! Eu escrevo sobre as minhas experiências e impressões. E um escritor escreve para ser lido!

11/04/2018 - postado no facebook

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