sexta-feira, 7 de dezembro de 2018

Venci!


Foram 4 meses "dormindo com o inimigo" sem saber;

Foram 8 dias esperando o diagnóstico;

Foram 5 dias esperando por uma vaga no IBCC;

Foram 2 meses de estadiamento;

Foram 26 dias esperando liberação de cirurgia;

Foram 4 linfonodos retirados e 1 mastecto radical;

Foram 2 meses de quimioterapia;

Foram 5 meses de angústia - desde perceber o nódulo até receber o resultado da biópsia final e saber que estava totalmente livre do carcinoma. 

Serão 5 anos de acompanhamento e tamoxifeno, mas estou livre!


É claro que não terminou, ainda estou em tratamento, mas hoje, nesse exato momento estou completamente livre do câncer. Refiz os exames todos após a quimioterapia e não restou nenhum vestígio de células cancerígenas no meu corpo.

Isso não significa que estou isenta de produzir outros tumores. Quem produziu um, pode muito bem produzir outros, mas as possibilidades agora são menores. Estou saudável de novo.

E o que fazer para não produzir novos tumores, novas células cancerígenas?
Não tem como prever isso, mas é possível diminuir muito os riscos:

 - TOME ÁGUA! Tome muita água, isso irá ajudar a eliminar as toxinas do seu corpo e fazer com que o seu organismo funcione adequadamente - são necessários ingerir 2 litros de ÁGUA por dia (chás, sucos e afins não substituem a água pura); 

 - FAÇA EXERCÍCIOS FÍSICOS regularmente - Isso faz com que o seu metabolismo funcione melhor, a sua imunidade se eleve e o seu organismo funcione bem, aumentando sua força, concentração e disposição - uma caminhada de ao menos 30 min por dia por pelo menos 4 vezes na semana é o mínimo necessário;

 - SE ALIMENTE CORRETAMENTE - uma das maiores causas do desenvolvimento de células cancerígenas está relacionada a má alimentação, obesidade e sedentarismo. Coma mais frutas, legumes e verduras, corte ou reduza ao máximo os produtos industrializados e diminua o consumo de carnes, doces e laticínios (isso já é um bom começo);

 - DIMINUA O ESTRESSE - a vida corrida, não parar nunca, se exigir demais e fazer mais do que o corpo aguenta é uma das causas relacionadas ao câncer. Diminua o ritmo, tire um tempo para si, descanse, durma bem e faça mais vezes coisas que lhe dão prazer. 

 - FAÇA O AUTOEXAME E EXAMES periodicamente. A maioria dos tumores é descoberta no autoexame ou exames de rotina. Quanto antes você descobrir um tumor maligno maiores são as chances de cura.

 - SEJA FELIZ - Uma mente sã, como já se sabe, produz um corpo são. 

Por mais que se escute isso tudo o tempo todo, infelizmente muita gente - eu incluso - só acorda para a realidade quando precisa enfrentar o bicho papão cara a cara. E por mais que eu queira gritar aqui para o mundo as minhas experiências e por mais que eu queira ajudar ou fazer com que mais pessoas possam escapar dessa doença que machuca tanto, o que vejo no hospital são salas abarrotadas de pessoas correndo atrás da cura e, por mais triste que isso seja, a maioria delas não irá se curar. A maioria chegou ali tarde demais.

O câncer é uma enfermidade cruel! O meu tumor tinha algo em torno de 8 meses de existência quando o retirei e eu o descobri relativamente cedo. Eu corri imediatamente atrás de tratamento e mesmo assim as consequências foram bem dolorosas: o câncer levou o meu lindo seio esquerdo, levou os meus cabelos volumosos embora,  me fez passar por efeitos colaterais intensos na quimioterapia (que foram apenas 4 ciclos - o mínimo no tratamento). Estou enxergando pior que antes, tive oscilações emocionais intensas (depressão e ansiedades terríveis), ainda sinto dores pelo corpo (levarão uns 6 meses para passar se eu fizer os exercícios físicos direitinho), minhas articulações ainda estão inflamadas... Ainda vou ter que esperar mais 10 meses para reconstruir meu seio (pelo menos mais duas cirurgias) e serão 5 anos em tratamento. Isso, porque descobri no início e corri para a cura. 

Me desculpem por insistir nisso, mas durante um tratamento de câncer algo mexe profundamente com a gente. É como se sentíssemos a obrigação de alertar as pessoas. De dizer à elas coisas que vamos descobrimos enquanto corremos atrás da nossa cura. É como se essa segunda chance, que a gente recebe, estivesse condicionada à ajudar quem está vindo atrás de nós. É algo bem comum - em pessoas que eu conheci nessa caminhada que estão em remissão ou curadas - esse desejo latente de melhorar a vida de quem está passando pelo mesmo ou alertar quem possa estar em risco. 

Eu estou vivendo um momento de libertação. Se passaram 9 meses desde que descobri o nódulo no meu seio. Faz um mês que fiz minha última quimioterapia e faz um dia que passei na médica - que olhou meus exames após a químio -  e ela me disse finalmente que estou curada e as chances de recidiva (no meu caso) são 0%, embora ainda esteja em tratamento. Estou curada, mas a vigilância e cuidados serão eternos. Eu estou fazendo a minha parte: cuidando de mim e alertando vocês que passam por aqui. Cuidem-se! Se amem! Se toquem!

Um beijo e toda minha gratidão.

Dra. Kelly (minha anjinha que me deu boas notícias) e eu

fotos: acervo pessoal

quarta-feira, 21 de novembro de 2018

Fim do Ciclo / Vida Nova!

Recomeçar...

Hoje terminou, finalmente, o ciclo (de 21 dias) da minha última quimioterapia. O câncer foi embora e a parte mais pesada do tratamento terminou. Agora é só me recuperar da batalha, 5 anos de tamoxifeno, acompanhamento médico e me manter fiel à uma vida saudável - pra nunca mais passar por isso outra vez. 



Caminhada com a minha amiga Jane, de leve para recomeçar, foram 5 km. E depois o meu café da manhã super do bem. Assim serão os meus dias. É assim que vou manter o câncer longe da minha vida para sempre.



Toda gratidão que houver nessa vida:
Pela minha segunda chance;
Por estar curada;
Por estar viva;
Por estar bem e com saúde outra vez.

Um beijo carinhoso à todos que me seguem.

quarta-feira, 7 de novembro de 2018

A Última Químio / Se Toca Amiga!

Eu já contei aqui, no blog, que o meu câncer foi totalmente retirado na cirurgia. Que não havia nenhum comprometimento de nenhum linfonodo, nenhum órgão e nem dos tecidos. Nem mesmo as margens do tumor estavam comprometidas por células cancerígenas. 

O tumor que eu tive era um nódulo formado por células de gordura, sendo que algumas delas sofreram alterações genéticas pelo excesso de hormônios - estrógenos e progesterona - no meu organismo, transformando-se em células cancerígenas. 

Quando se ouve falar em um tumor, de 2 cm, a gente logo imagina que tem um câncer de 2 cm, mas a coisa não é bem assim. Células cancerígenas se formam dentro de um tumor, rapidamente se proliferam e tomam conta desse tumor, invadem os tecidos - metástase próxima-, entram na corrente sanguínea e se desenvolvem em outros órgãos e partes do corpo - metástases distantes e espalhadas. Eu tive sorte, muita sorte. Descobri em tempo. Muito antes disso tudo acontecer comigo. No meu caso, o tumor era uma massa de gordura contendo em seu interior apenas 16% de células cancerígenas. Essas células ainda estavam encapsuladas dentro do tumor. Isso é um grande motivo para comemorar e o que me faz estar entre uma porcentagem maior de cura. 

O tumor, apesar de médio, ainda estava em estágio inicial. Quando penso nisso agradeço muito por ter me tocado, naquela noite do dia 16/03/2018, e ter encontrado o nódulo. Se eu não tivesse feito isso, se não tivesse percebido logo, a história poderia ser bem diferente hoje. O tratamento, que já foi tão agressivo nessas condições, poderia ter sido muito pior e as chances de cura bem menores ou nulas. Agradeço sempre por ter o hábito de me examinar. Por ter encontrado o nódulo e ter corrido imediatamente atrás de auxílio médico. Isso fez toda a diferença. Não significa que estou totalmente livre - não ainda - mas as minhas chances de estar curada hoje são de 90%. 

Mais do que qualquer exame "preventivo", o ato de me tocar foi essencial para o meu rápido diagnóstico e aumentou muito minhas chances de cura. Eu não era uma pessoa relapsa. Faço anualmente um check up. Fiz uma mamografia em dezembro de 2017 e o nódulo não apareceu no exame. Em março de 2018, ao me tocar encontrei um caroço do tamanho de uma uva. Faço um aqui então alerta: se toque, se examine sempre, não tenha medo do que possa encontrar! Se achar algo suspeito, corra! A maioria dos achados, cerca de 80%, são de origem benigna, mas não tem como saber isso sem examinar o achado. Mamografias, ultrassom, ressonância ou biópsias são necessárias para descartar ou confirmar malignidade. Muitas mulheres têm medo de se examinar, dizem que quem procura acha! Mas outro dia ouvi, de um médico, o complemento dessa frase: "e quem acha, cura!"

Apesar de ter encontrado relativamente cedo o tumor, o protocolo do tratamento envolveu, como sabem, uma mastectomia e quimioterapia adjuvante (preventiva) até agora. Ainda faltam algumas etapas. No fim do mês começo a tomar o tamoxifeno, terei exames de rotina e acompanhamento oncológico por cinco anos. Só então, depois desse tempo, caso não tenha nenhuma intercorrência em relação à doença, terei alta. 

Não foi nada fácil passar por esses quatro ciclos de quimioterapia. Ainda estou me recuperando da última aplicação, que aconteceu no dia 31/10/2018, Mas me sentiria até envergonhada de reclamar, sabendo que muitas pessoas, muitas mesmo, passam por tratamento muito mais longos e dolorosos do que o meu. Conheci pessoas incríveis - lutando com muita bravura e coragem - com histórias complicadíssimas. Passar por uma quimioterapia mexe com você por inteiro. Só quem passa por isso sabe do que estou falando. Não tem nem como explicar, só sabe quem passa por isso. Mas, tudo o que se vive durante um tratamento oncológico faz de você uma pessoa muito diferente do que era antes. Ninguém passa por isso tudo e permanece o mesmo.


Além de lidar com o medo e o estigma de morte o tempo todo - se não a sua, a de pessoas que você conhece e se afeiçoa -, você ainda precisa lidar com todas as transformações que estão acontecendo no seu corpo, na sua vida e no seu emocional.

Durante esses seis meses vivi uma avalanche de emoções. Você precisa se reabastecer de coragem e forças o tempo todo. E você conhece o melhor e o pior das pessoas. Acho que as coisas acabam ficando mais claras. Você passa a enxergar tudo com muito mais honestidade e todos também acabam se mostrando como realmente são. Essa é a parte boa de tudo. Sempre gostei de saber a verdade, por mais cruel que ela seja. Se muitas coisas ruins acabam vindo à tona, muita coisa boa também surge. Descobri que tinha pessoas inacreditavelmente maravilhosas à minha volta e que o mundo ainda é um lugar de pessoas boas na sua maioria. Estreitei relações que ficarão por toda eternidade. Chorei e ri com pessoas que amo e que me amam. Fiz amigos e reencontrei pessoas lindas que estavam distantes. Eu nem vou agradecer individualmente porque esse texto não teria mais fim. Eles todos sabem o quanto estou grata. OBRIGADA, OBRIGADA, OBRIGADA!

A minha recuperação desse último ciclo está sendo bem mais tranquila. Não estou mais ansiosa e não tive nenhum efeito colateral debilitante. Acho que o fato de saber que acabou me deu um gás extra. A medicação ainda vai levar cerca de seis meses para ser totalmente eliminada do meu organismo. Algumas sequelas serão inevitáveis. Acho que nunca mais enxergarei bem como antes, já que a presbiopia - que aconteceria naturalmente - foi acelerada pela químio. Ando muito esquecida, ainda sinto dores no corpo e estou mais cansada que o normal, mas a deprê e ansiedade - que mais estavam me incomodando muito - foram embora. Espero que para sempre! Agora estou me empenhando em recuperar meu corpo, minha energia e os meus cabelinhos - que já começaram a nascer, bem loirinhos - uma graça! Daqui alguns dias vou recomeçar a dieta anterior ao tratamento, continuar reforçando a minha imunidade, voltar a correr e fazer exercícios físicos. É a única forma de dizer adeus definitivamente para o câncer.

Dia 22 começo a tomar o tamoxifeno. Ainda não sei como vai ser, mas acredito que será bem tranquilo. Consegui passar relativamente bem pela quimioterapia - os efeitos emocionais foram os piores. Apesar de ter ficado um pouco inchada em alguns períodos, engordei apenas 1,5 kg durante o tratamento. Isso é algo realmente importante, pois é bastante comum engordar muito durante a químio. Vi relatos de pessoas que engordaram  mais de 18 kg em apenas quatro ciclos. Acho que a alimentação que adotei ajudou nisso também. Durante os ciclos consegui recuperar, em apenas 15 dias, 100% das minhas plaquetas e de todo o sistema imunológico. Não tive nenhuma infecção - que também é bastante comum - e poucos episódios desconfortáveis ou de fraqueza. 

No penúltimo ciclo fiz  um teste para ver a eficácia da minha alimentação. Durante o ciclo inteiro não tomei o suco para elevar a imunidade - tomava apenas os suplementos - e os resultados foram impressionantes. Com o suco a quantidade de células brancas iam de 3 mil (no auge da baixa na químio) para 9 mil (quinze dias depois). Sem o suco foram de 3 mil para apenas 5 mil. Todo o exame deu alterações significativas (com e sem os sucos). Isso só prova o que a gente já ta cansado de saber: uma boa alimentação é a chave para uma vida saudável.

Muita gente tem me perguntando sobre minha alimentação. Quero escrever sobre isso, mas durante o processo percebi a grande responsabilidade que isso implica. Não posso simplesmente escrever receitas de sucos e falar da dieta que tenho feito, porque para chegar à alimentação adequada precisei fazer inúmeros exames de sangue -  e então saber o que o meu corpo produzia e o que não produzia - para saber o que eu precisava repor ou evitar.  Respondi um questionário gigantesco para a nutricionista e tudo o que pesquisei e descobri foi em torno do que iria funcionar para mim. Tudo foi levado em conta: meu biotipo, o tipo de tumor que tive, o tratamento, a medicação e a recuperação que eu precisava. Não é simplesmente uma fórmula mágica que vai funcionar para todo mundo. É uma responsabilidade muito grande, então preciso pensar muito bem no que vou escrever aqui.O que já posso adiantar é que cortar produtos industrializados e fazer uma alimentação mais balanceada vai ajudar qualquer pessoa se manter mais saudável.

Ainda tenho muito o que falar aqui sobre o tratamento e toda essa experiência que estou vivendo, mas quero fazer isso com calma para poder realmente ajudar, de alguma forma, quem esteja precisando dessas informações. Agora que a minha vida está retomando o seu curso eu tenho muitas pendências para resolver, muitas coisas que ficaram suspensas e que preciso fazer ainda, mas assim que possível volto aqui para contar mais coisas para vocês.

Obrigada, por me fazerem companhia nessa jornada.
Deixo aqui a mesma mensagem que escrevi no mural do IBCC no dia da minha última químio:

"Queridos Companheiros de Jornada! Hoje faço a minha última químio e queria dizer à vocês que estão começando seus tratamentos que NÃO DESISTAM! Por mais difícil ou complicado que sejam alguns desses dias, essa é a sua chance de CURA, de tratamento e talvez de melhorar a sua vida pós câncer. Eu sei bem que não é algo fácil, mas VAI PASSAR! Por mais longo e doloroso que seja, sempre há esperança e sempre há uma nova chance. Eu acordo TODOS os dias pensando: "É hoje que vão descobrir a cura definitiva de todos os cânceres!". E um dia será! Um abraço afetuoso - 31/10/2018 "






segunda-feira, 29 de outubro de 2018

Na estrada

♪♫
Ela vai voltar, vai chegar
E SE DEMORAR, I´LL WAIT FOR YOU!!!
Ela vem, e ninguém mais bela
Baby, i wanna be yours tonight
Sem botão, no tempo
No topo, no chão
Em cada escada
A caminhada
A pé
De caminhão...
Seu horário nunca é cedo
Aonde estou?
E quando escondo
A minha olheira
É pra colher amor...
Sala, sem ela, tem janela
Inclino, em cerca de atenção
Ela vem, e ninguém
Mas ela vem
Em minha direção
Sala, sem ela tem
Janela inclino
Em cerca de atenção
ELA VEM E NINGUÉM MAIS BELA
VEM EM MINHA DIREÇÃO.
Sem botão, no tempo
No topo, no chão
Em cada escada
A caminhada
De caminhão...
Seu horário nunca é cedo
Aonde estou?
E QUANDO ESCONDO
A MINHA OLHEIRA
É pra colher amor...
Sala, sem ela, tem janela
Inclino, em cerca de atenção
Ela vem, e ninguém
Mas ela vem
Em minha direção
Sala, sem ela tem
Janela inclino
Em cerca de atenção
Ela vem, e ninguém
Mais bela vem
Em minha direção...
♪♫
na estrada - marisa

Empatia

Hoje, no hospital, quando abracei a Cristina (uma mulher que eu nunca tinha visto na vida antes) que saiu da sala de ultrassom com os olhos rasos d`água, trazendo na mão o diagnóstico de um nódulo (de 2 cm) na mama esquerda, sem sequer saber ainda se é um tumor maligno ou não. Eu chorei! E ela me disse: "você tá chorando! Nem eu estou chorando ainda, nós acabamos de nos conhecer..." e eu respondi: "mas eu sei exatamente o que você está sentindo".

Isso, se chama empatia.

quinta-feira, 18 de outubro de 2018

O sétimo dia...

O sétimo dia após a quimioterapia é aquele em que o sol volta a brilhar pra mim. É o dia em que recomeço a batalha para aumentar minhas plaquetas e levantar o meu sistema imunológico. É quando vejo o milagre da alimentação correta me trazer de volta à vida.

As olheiras são de fazer inveja a qualquer ursinho panda, ainda há um resquício daquela depressãozinha que não quer largar o osso, mas é quando a esperança volta a dominar. E é quando percebo como tudo está relacionado: imunidade baixa = depressão = efeitos colaterais mais exacerbados = posts sombrios.  E qual o segredo para reverter essa situação? Aumentar a imunidade. Aumentou a imunidade a vida começa a ter mais cores, mais sabores e alegrias. Os dias cruéis começam a ficar para trás e até a próxima aplicação terei quinze dias de trégua.

A minha médica explicou que a quimioterapia (no meu caso, ao menos) funciona assim: do momento da aplicação, até três dias depois, tenho algumas pequenas reações alérgicas - e isso faz os três primeiros dias serem meio chatinhos porque tomo antialérgicos bem fortes que me deixam meio piradinha, sonolenta, irritada e cansada. É quando acontece de eu ficar com manchas avermelhadas na pele, aquelas agulhadas (que parece que você rolou na grama molhada pelo lado de dentro do seu corpo), quando fico com aquele gosto amargo e metálico na boca e outras coisinhas que já contei pra vocês no post anterior. Do terceiro ao sétimo dia é quando a droga faz efeito e derruba as suas plaquetas lá em baixo. Não apenas as plaquetas, mas você se sente completamente nocauteada. O pior dia para mim é o quarto dia. É quando me sinto muito fraca, sem vontade de fazer nada, sinto o mundo desabando e fico muito deprimida (e acabo escrevendo os posts mais tristinhos desse blog). Mas, essa é uma depressão que tem causas físicas e tempo curto de duração. A quimio acaba também com a sua produção dos "hormônios da felicidade": a endorfina, a serotonina, a dopamina, a oxitocina e a anandamida. E sem esses hormônios trabalhando no seu corpo até a pessoa mais feliz do mundo vai ficar pra baixo e passar a perceber todo o cinza a seu redor. Passado o efeito da droga a gente volta a produzí-los todos e volta a achar a vida bela.

No meu caso, no quinto dia é quando eu começo lentamente a me recuperar. No sétimo já acordo animada, feliz de novo e cheia de planos. Até me esqueço do quanto os dias anteriores foram tão pesados e exaustivos. É quando então as pessoas, que seguem esse meu blog, devem achar que eu sou bipolar ou bem maluca mesmo. É quando eu começo a postar as coisas que me animam, a dividir minhas descobertas e paro de choramingar pelos cantos. Volto a me achar bonita, a gostar de quem eu sou e volto a acreditar que sou abençoada e que eu tenho muita sorte. É quando eu volto a enxergar todas as coisas boas e transformações positivas o câncer trouxe pra mim.

Eu devia ter contado isso antes para vocês, mas só agora, depois de três ciclos de docetaxel, foi que eu comecei a compreender melhor como as coisas estão funcionando. Dito isso, vocês podem continuar seguindo o blog sem achar que a pobrecita da Dri tá ficando doida de pedra. Daqui treze dias começa tudo de novo: aplicação do medicamento, três dias com reações alérgicas, mais quatro dias de efeitos colaterais e depois o sol vai brilhar de vez e definitivamente... ou até eu começar o tamoxifeno no dia 21/11/2018 - esse ainda só sei de ouvir falar, mas como ele vai antecipar a minha menopausa, já imagino que vem um turbilhão de emoções por ai. Depois eu conto como será.

Obrigada por virem aqui,  mesmo que vocês não comentem... Ah! eu vejo a quantidade enorme de pessoas que passam por aqui em cada post. OBRIGADA!
Muito, muito, muito obrigada!

Beijo!

Foto: acervo pessoal



domingo, 14 de outubro de 2018

Tirando de letra?

Essa ai ao lado sou eu, vista pelo meu filho Tomás que tem cinco anos. É a melhor definição de mim nesse momento da minha vida. Em poucas linhas ele conseguiu colocar no papel exatamente um resumo exato meu: uma pessoa nua com um peito só, costurada do lado esquerdo e alguns fiapos de cabelos que insistem em crescer.

Ninguém passa por uma quimioterapia sem sofrer alguma transformação e sem se tornar, talvez, um pouco mais humilde. Não é apenas por sentir as drogas, literalmente, percorrendo cada célula do meu corpo. Enquanto sinto o gosto amargo e metálico tirando o meu paladar, o estômago embrulhado - tirando o prazer de todas as coisas que eu gostava -, as agulhadas espalhadas pela minha pele - excitando cada um dos meus neurônios - e essa dor de cabeça estranha - diferente de todas que eu já senti, estou mudando completamente a minha composição. Não apenas a física, mas toda a estrutura emocional também.

Há um ano eu sequer poderia imaginar que um dia estaria imersa numa situação tão inédita. Num misto de sentimentos tão contraditórios: ao mesmo tempo em que me sinto completamente grata por tantas descobertas e enfrentamentos sobre mim mesma, me sinto tão frágil, insegura e impotente diante de tantos efeitos colaterais. Eu sei que é temporário, mas estou aqui e agora inserida nesse momento, que parece não ter fim. Sei que vai passar, que está passando rápido - só falta mais um ciclo-, mas o resultado da última aplicação ainda lateja no meu corpo - ainda preciso me recuperar dessa e me preparar para a próxima - e cada vez parece mais intenso e longo. Não tem como não pensar nas sequelas e consequências quando ainda se está vivendo a coisa toda.

Você sente, e se dá conta de, cada ossinho e de cada veia do seu corpo. Cada um dos meus neurônios  estão perceptíveis pra mim e não sei ainda quanto bem ou quanto mal essa droga, passeando agora pelo meu corpo, está me causando. Estou enxergando tão mal! O meu processo de presbiopia foi drasticamente acelerado pela quimioterapia. Tenho esquecido palavras do meu cotidiano, como brócolis - que como todo santo dia -, por exemplo. Ando tão ansiosa, com os ouvidos constantemente entupidos e os nervos à flor da pele. A quimioterapia te deixa muito deprimida, muito mesmo! Não estou conseguindo ler mais e ver um filme inteiro sem dormir é uma verdadeira conquista - felizmente ainda consigo escrever. E essa sensação metálica, como se estivessem esfregando uma palha de aço em cada um dos seus ossos, te deixa em constante alerta e você já não se lembra mais como era a sua vida antes dela. Os meus músculos latejando já deixaram de me divertir faz algum tempo e eu só queria que parassem de se mexer assim, sozinhos.

Eu, apesar de compreender, sempre fico pensando quando pessoas queridas me dizem frases prontas - repetidas inúmeras vezes na tentativa de me fazerem me sentir melhor. Que eu não sou uma "guerreira corajosa que está tirando isso tudo de letra". Não mesmo! Eu só sei que querendo ou não, com medo ou não, forte ou fraca é algo da qual eu não tenho como fugir. É algo que eu não tenho outra alternativa a não ser enfrentar. E fico pensando em tantas pessoas, tão incríveis, que tenho conhecido - que não tiveram a mesma sorte que eu de descobrir a doença no início - e mesmo elas sendo tão mais corajosas e determinadas que eu talvez não se curem. Penso no quanto aquela senhorinha idosa, tão frágil, tomando doses muito maiores que as minhas e indo embora pra casa sozinha, é infinitamente mais forte e corajosa que eu. Tive vontade de abraça-la, de segurá-la no meu colo e cuidar dela como se cuida de um bebê.

Eu não reconheço mais a minha imagem no espelho, além da aparência, há algo no olhar, algo que eu não consigo identificar, mas que não é mais familiar para mim. A quimioterapia não está destruindo apenas células cancerígenas (se ainda havia alguma) ou apenas as células boas do meu corpo (o que provavelmente está acontecendo). É muito mais que isso, ela está destruindo completamente parte do que eu sou. Ao mesmo tempo em que sinto essa imensa gratidão pela oportunidade de estar aqui, nesse exato instante, me curando completamente de uma doença mortal eu também sinto esvaindo de mim grande parte de quem eu sou ou de quem eu fui.

meu desenhista preferido no mundo inteiro

Fotos: Adriana Mani




sexta-feira, 12 de outubro de 2018

Autoestima em forma de amor em mechas.


Em abril de 2018, quando recebi o diagnóstico de câncer de mama, entre o turbilhão de pensamentos com que fui inundada, uma das coisas em que eu pensei muito naqueles dias foi no quanto o tratamento da minha doença seria duro e um tanto quanto cruel. Vou perder os meus cabelos! Chorei. E antes mesmo de saber em que pé estavam as coisas e qual a real extensão da minha enfermidade eu fui ao salão de um amigo e disse pra ele: "raspa tudo!". Mesmo as pessoas me dizendo que eu estava me precipitando e que talvez eu nem fosse precisar fazer quimioterapia e que, se fizesse, poderia não cair os meus cabelos. "Eu não vou perder os meus cabelos pra uma doença", respondi, "essa decisão ainda vai ser minha". E mandei ver a máquina nos meus cabelinhos.

O Eduardo, meu cabeleireiro, ainda fez uns charmes e saí bonitinha do salão. Ainda levaria alguns meses para eu realmente perder toda a minha juba. Nesse tempo de espera o meu cabelo cresceu e tive que cortar curtinho mais duas vezes, antes de iniciar de vez a quimio. E nesse período muitas coisas, muitas informações e transformações foram acontecendo e eu fui mudando muito o meu modo de encarar as coisas. 
Diria que eu aprendi mais sobre mim mesma nesses últimos seis meses do que nos 46 anos anteriores. Meus cabelos passaram a ter a menor das importâncias para mim. Tudo o que eu queria era estar livre do câncer, me curar e reverter toda a situação. Queria estar novamente saudável apesar das consequências. No final de agosto comecei finalmente a segunda etapa do meu tratamento: as temíveis quimioterapias. Meu cabelinho, que estava curto, mas crescido novamente, enfim não resistiram. Contei pra vocês na postagem: Tchau Cabelo - Parte II.

No dia 13 de setembro de 2018 eu fiquei careca de vez. Quinze dias após a primeira aplicação eles não resistiram. Foi diferente do que eu havia imaginado. Mesmo, há meses já, com o cabelo curto, foi doloroso passar a mão por eles e vê-los caindo, como se tivessem assoprado um dente de leão ao vento. Eu já sabia que isso iria acontecer e já estava preparada para isso. Mas, a realidade é que, mesmo tendo raspado os cabelos em abril, aquela escolha - por mais que eu quisesse provar que era - não era minha. Os meus cabelos foram embora contra a minha vontade, essa era a cruel verdade. Eu não fiquei amargando o luto por muito tempo. Assim que começaram a cair, fui lá e raspei de novo. Fiquei com essa carinha ai ao lado por alguns minutos apenas. Foi o tempo de tomar banho para ver o restante da penugem ir literalmente por água abaixo. Não chorei. 

Ainda estranhava muito a minha imagem no espelho. Por mais que eu estivesse aceitando a situação e tivesse a convicção de que isso tudo é passageiro, e que é apenas um efeito colateral de um tratamento, eu não queria sair na rua com cara de doente. Não queria as pessoas me olhando ou sentindo pena. Justo agora que não tenho mais câncer? Justo agora que me livrei da doença vou ficar com cara de doente? Durante todo o tempo que estive doente, gravemente doente, ouvia das pessoas que estava ótima, que estava forte e que não parecia doente. Agora que estou livre disso tudo as pessoas vão me olhar com pena? Passei a usar lenços coloridos, mas não era o suficiente para ser ignorada na multidão. Eu queria ser igual, queria passar despercebida nos lugares, sem aqueles olhares de dó que as pessoas fazem antes de te dizerem que você está linda.

Dias depois a sobrinha da Cida, a querida professora do meu filho, a Luana Tomaselli, resolveu se tornar a minha madrinha em mais um dos projetos lindos que o câncer me deu oportunidade de conhecer. A Luana, mesmo sem me conhecer pessoalmente, me indicou no projeto e me apresentou para a Débora Pieretti, uma das mulheres maravilhosas que eu tenho conhecido ao longo dessa minha jornada.

A Débora, passou por um câncer de mama em 2015 e, como muitas de nós, sentiu um chamado. O desejo de fazer alguma coisa com a sua dor. Quando participou de um evento, para pacientes oncológicos, ela conquistou sua autoestima de volta ao ganhar uma peruca. E enquanto arrumava sua peruca no salão ela decidiu: "quando estiver melhor é isso que vou fazer: vou ajudar outras mulheres a sentir isso que estou sentindo agora!". E desde setembro de 2016 ela trabalha incansavelmente por essa causa. Eu fui a sua causa número 729! 

No dia 01/10/2018, na abertura do Outubro Rosa, na Assembléia Legislativa de São Paulo, junto com outras pacientes, ganhei a minha peruca das mãos da querida Débora, por intermédio do seu projeto: Amor em Mechas. Foi um dia muito especial para mim. Não apenas por estar recebendo uma peruca linda, de ótima qualidade, muito parecida com o meu cabelo original, feita totalmente gratuita e especialmente para mim, mas porque a Débora, e outras palestrantes incríveis, fizeram por mim muito mais que me deixar com um aspecto mais saudável -  através dos kits maravilhosos que ganhei -, mas porque me devolveram realmente autoestima, autoconfiança e algo que há muito eu não sentia: estar plenamente a vontade com quem eu sou.
Tanto que no meio do meu depoimento no evento, tirei o meu chapéu e o meu lenço enquanto falava, sem a menor vergonha de ser quem eu sou de verdade. De como estou na realidade.

O que a Débora e o Instituto Amor em Mechas faz, é muito mais que devolver autoestima. É um verdadeiro ato de amor ao próximo, de irmandade e apoio às mulheres. Eu fiquei encantada com o que elas fazem. Uma dedicação, em tempo integral e totalmente despretensiosa. Eles arrecadam mechas nos salões e eventos espalhados pelo Brasil e com essas doações fabricam perucas maravilhosas e doam para pacientes oncológicos ou pessoas portadoras de alopecia. É um trabalho lindo e eu quero convidá-los todos para conhecer e fazer parte. Vocês podem entrar em contato com a equipe para saber como doar ou solicitar a sua peruca, inteiramente grátis. Basta clicar aqui: AMOR EM MECHAS! 

Eu e minha careca no evento

E com a minha peruca, com cara de Adriana de novo.

Eu tenho muito a agradecer, uma vez mais, por tudo que tenho recebido nessa minha trajetória. Só o fato de estar conhecendo pessoas tão enriquecedoras e verdadeiramente generosas já vale a pena estar passando por tudo que estou vivendo. Obrigada, obrigada, obrigada!

Fotos: Adriana Mani e Página IAM - Instituto Amor em Mechas, gentilmente cedidas por Débora Pieretti.










terça-feira, 2 de outubro de 2018

Outubro chegou

Todo ano quando chega outubro o Brasil se veste de rosa. Colocamos um lacinho na lapela e falamos para todo mundo sobre a necessidade de fazer o autoexame de mamas e a mamografia anual a partir dos 40 anos.

Ontem, na abertura do outubro rosa, na Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo, tive a oportunidade de falar um pouco mais sobre isso. Eu estava entre mulheres inspiradoras. Cada uma delas contribuiu para que eu aprendesse um pouco mais com essa doença que recentemente me visitou. Cada uma tirou uma pedrinha do meu caminho e me disseram: vá tome o teu lugar na vida!

Nós temos ouvido ano após ano sobre as recomendações e cuidados que devemos ter com as nossas mamas. A cada ano pessoas empenhadas como essas, vem nos alertar sobre o perigo que nos ronda. Ouvimos, em todos os meios, que é preciso fazer exames preventivos. Na verdade, eu preciso acrescentar, os exames não são preventivos de câncer. O que previne um câncer é tudo aquilo que você pode fazer antes do tumor aparecer: uma alimentação saudável, exercícios físicos, não beber em excesso, não fumar e não ter uma predisposição genética (se isso fosse possível). Exames médicos não vão te livrar de ter um câncer, mas podem te livrar de uma sentença de morte. Eles servem para um diagnóstico precoce da doença e isso pode salvar a sua vida.

Eu sou uma mulher cuidadosa que há muitos anos tem ouvido esse alerta. Desde os meus 35 anos, hoje tenho 46, faço frequentemente o autoexame e faço anualmente uma mamografia. Em dezembro de 2017 eu fiz a minha consulta anual, fiz a mamografia e saí do consultório com um laudo escrito: "não há evidências de nódulos". No dia 16 de março de 2018, fazendo o autoexame, percebi um nódulo no meu seio esquerdo, ovalado e medindo cerca de 2 cm. No dia seguinte, cuidadosa que sou, passei no mastologista que me pediu outra mamografia e um ultrassom. Novamente saí da sala de mamografia com um exame escrito: "não há evidência de nódulos" e mais: "nenhuma alteração desde o último exame realizado em 04 de dezembro de 2017". Em seguida entrei na sala de ultrassom e lá estava ele: um nódulo de 2,1cm, circunscrito, vascularizado e que uma biópsia posterior revelou: Carcinoma ductal invasivo grau I. O resto da história, todos que acompanham o meu blog conhecem: fiz mil exames, cirurgia, quimioterapias em andamento e ainda vou tomar tamoxifeno por mais 5 anos.

O que eu preciso dizer aqui é sobre a necessidade  sim de se fazer uma mamografia anualmente, mas que  existem tumores que não aparecem na mamografia e eu descobri isso da pior forma. E quero alertá-las: quando o seu médico pedir a vocês apenas uma mamografia, principalmente se você é atendida pelo SUS, diga à ele que você também precisa de um ultrassom. Se eu tivesse tido essa informação antes e tivesse feito um ultrassom em dezembro de 2017, provavelmente eu não estaria aqui agora usando uma prótese mamária externa. Eu não teria precisado passar por uma mastectomia radical e nem iria precisar dos 4 ciclos de quimioterapia que estou fazendo. Em dezembro o tumor teria sido descoberto ainda bem no início e teria tirado apenas o nódulo e não a mama toda. Façam seus exames médicos sempre! Mamografia e Ultrassom. Mas não esqueçam que o mais comum é descobrirmos sozinhas no autoexame. Se toquem como eu me toquei, corram se encontrarem algo suspeito, como eu corri, para ter a chance de serem salvas como eu fui!

Durante as duas horas do evento, tive a oportunidade de conhecer mulheres com lindas histórias de vida. Mulheres que passaram ou estão passando pela experiência de um câncer, mas que transformaram suas dores em algo muito belo. Mulheres que realmente fazem acontecer. Que seguiram o chamado e hoje se propõem amenizar o caminho de outras que vem chegando. Eu ainda estou bem no meio desse caminho, mas já estou ouvindo esse chamado. Essa necessidade de gritar, aos quatro cantos, todas as coisas incríveis que o câncer está me ensinando. Uma vontade férrea de acolher, apoiar, amparar  e amar a cada uma dessas mulheres que estão passando pela tortura de esperar por resultados de exames ou que acabaram de receber um diagnóstico positivo de câncer. Tenho o desejo de toma-las pela mão e dizer-lhes: vêm comigo, por aqui o caminho tem menos espinhos. Do mesmo modo que mulheres como:  Cristiane, Luzia, Cecília, Ivone, Edilene, Edna. Fernanda, Débora, Cida, Eunice, Vanessa, Gislene, Graça, Helena, Neusa, Celma... Mulheres que me acolheram com sinceridade, me tomaram pela mão e estão tirando os espinhos do meu caminho. Mulheres que estão fazendo com que eu embale a minha dor assim como as ostras embalam suas pérolas. Fazendo com que eu aprenda a me amar. Amar essa pessoa que estou me tornando e a não ter a menor vergonha de quem eu realmente sou.


Dizer obrigada, me parece tão pouco, tão pequeno!
Mas é só isso que posso dizer: OBRIGADA!

Fotos: Bino Reises @binoreises







quarta-feira, 26 de setembro de 2018

Vida online, vida offline.

Texto antigo que escrevi no facebook à cinco anos, mas achei tão atual que resolvi postar de novo:


Vida on line

Vida off line

Eu sou do século passado, vivi o antes e o depois do advento da internet.

Algumas coisas ficaram realmente melhores. Não sei como sobrevivi, e tive filho antes, sem a maravilha das maravilhas do google.
Não consigo imaginar como teria conhecido alguns dos meus amigos mais queridos e o grande amor da minha vida se não fossem aquelas comunidades do orkut.
Um click e 'voilá' a receita da carne à provençal, a bula do remédio, aquela informação tão preciosa, o mapa do mundo inteiro e todas as respostas para uma mãe desatualizada no babycenter clube.
Ninguém precisa mais de enciclopédias, de sair de casa para comprar nada e eu amo poder mostrar todas as coisas do século passado, para os mais jovens, no youtube...

Ter conhecido um mundo sem internet também tem grandes vantagens, todos os amigos que conheci, inclusive os que fiz via internet, e temos uma interação olho no olho, continuam meus amigos até hoje. Tenho amigos de jardim de infância e a fabulosa internet me permitiu encontrá-los todos.
Porém, a internet me fez conhecer muita gente, boas e más, que simplesmente passaram. Vieram como foram, muitos sequer lembro o nome e fico tentando me lembrar quem eram quando vejo algum e-mail ou postagem mais atinga.
Às vezes acho que a internet trás informação demais e numa velocidade trucidante. Informações na maioria das vezes, processadas incorretamente. Ficou ainda mais fácil cometer erros, principalmente de interpretação, magoar e ser magoado.

A internet cansa... mas como sobreviver sem ela?

Como saber o que o meu amigo lá da conchinchina anda fazendo?

Como saber tudo o que está acontecendo, em tempo real, na vida dos meus amigos, na família, aqui ou no resto do mundo?
Antigamente a gente sentia saudades, imaginava o que a pessoa estaria fazendo e em algumas situações ligava, escrevia cartas e ficava ansioso aguardando uma resposta. Isso fazia, talvez, a vida andar de forma menos sufocante. Eu não preciso perguntar nada aos meus amigos e nem eles a mim, porque todas as informações estão aqui. Tudo o que tenho feito, como estou me sentindo, em que estou trabalhando, sonhando ou planejando...
Ninguém precisa mais sentir saudades, se você está com saudades de alguém, entra na página dela e mesmo que ela esteja off line todas as notícias dela estão ali. Ninguém precisa fazer mais nenhum esforço para saber notícias suas ou estar com você olho no olho... Um click e você mata todas as suas curiosidades.
O mundo sem internet tinha mais cheiro, mais sabor, mais vozes, barulho de risadas, arrepios, mais olhares que diziam tudo sem dizer nada... e eu sinto tanta falta disso!
Informação demais cansa... e quando a gente fica cansado, precisa descansar!

Plagiando a Paula Toller, eu poderia cantar:

"Só tenho tempo pras manchetes, nunca o conteúdo!
E o que acontece na novela, todo mundo posta no Facebook.
Escolho os filmes que eu não vejo, no netflix!
Nos comentários que eu encontro na crítica do filmow!
Nós temos pressa e tanta coisa interessa e nada tanto assim!
Ler apostilas em todo site, coisa tão normal.
Leio os roteiros de viagem enquanto falo no bate papo!
Conheço quase o mundo todo pelo Google Maps, 
eu sei de quase tudo um pouco e tudo muito mal. 
Eu tenho pressa e tanta coisa interessa..."

Nada tanto assim, original aqui ó:

quarta-feira, 19 de setembro de 2018

Tempos Modernos e/ou O Marido Ideal



"Tempos Modernos.
Lytton Strachey, por Dora Carrington - 1916
Diego Moreira, por Adriana Mani - 2018"


Menos duas! Metade já foi!

Um pequeno susto e uma constatação linda.

Entre uma medicação e outra deu até tempo de brincar de Dora Carrington e fazer uma foto, totalmente despretensiosa, do meu amor.

Dora amava o Lytton e fez essa pintura dele em 1916. Eu amo o Diego e fiz essa foto dele hoje, 19/09/2018. Como eu também amo arte, não foi difícil identificar as semelhanças entre eles.


Minha infusão hoje começou bem tranquila, como já tinha feito uma, sem nenhuma intercorrência, eu estava bem calma. Tomei a pré medicação enquanto papeava com a minha amiga Cris no celular. Em seguida a Daniele colocou o Docetaxel e tudo caminhava bem. Mas, depois de dez minutos de infusão comecei a ter uma aceleração cardíaca, meu rosto esquentou e comecei a me sentir meio estranha. Pensei que estava tendo uma crise de ansiedade, mas comecei a ter outros sintomas não habituais: um leve ardor no nariz, uns choquinhos por toda a extensão da coluna e pelve, boca seca e garganta arranhando. Então pedi para o Diego chamar a médica - que na verdade estava na minha frente, pois ela fica num balcão no centro da sala de onde ela consegue ver todos. 

Imediatamente elas estavam (duas enfermeiras e a Dra. Letícia) à minha volta. Elas desligaram o infusor, a médica me explicou que o que estava acontecendo era absolutamente normal e esperado, disse que iam me fazer uma medicação para bloquear as reações e que esperariam mais 15 minutos antes de religar. Isso tudo aconteceu em, no máximo, 2 minutos entre os sintomas e o controle, mas foi bem chato. A medicação fez efeito imediato e os sintomas desapareceram, mas eu fiquei bem nervosa (apesar de aparentar estar bem calma), minha pressão subiu um pouco e levei 25 minutos até estar totalmente tranquila de novo. Só então a médica reiniciou o processo. Levei ainda uns cinco minutos até acreditar que realmente não iria acontecer de novo.

Depois disso foi tudo bem tranquilo como da primeira vez. A minha onco, Dra. Kelly, já tinha me alertado que o segundo ciclo costuma ser o mais chatinho de todos. No primeiro o corpo da gente é pego de surpresa com a medicação e pode dar ou não reações alérgicas. Já no segundo ciclo o organismo reconhece que tem algo estranho acontecendo e por isso acontecem mais reações alérgicas. Depois disso o nosso corpo começa a se acostumar com a droga e as reações alérgicas costumam não aparecer mais (assim espero). Tudo não passou de um susto mesmo. Recobrei a confiança e até consegui voltar a tirar fotos e papear com as amigas pelo whats para me distrair um pouco.  Acho até que o tempo pareceu correr mais rápido dessa vez. 

O Diego foi buscar um café e eu fiquei conversando com a Dani (uma linda que atende pelo nome de enfermeira. Já tá ficando repetitivo o tanto que eu digo que o pessoal do IBCC é maravilhoso, mas não é nenhum exagero não, em todas as interações que tive com todos lá, nesses 4 meses de tratamento, fui positivamente surpreendida). Mas, continuando, fiquei conversando com a Daniele e falamos bastante sobre a importância do paciente ter o apoio da família e das pessoas que o amam. Ela me disse que consegue identificar melhoras impressionantes quando o paciente está positivo, alto astral e recebe amor e apoio durante o tratamento. Que isso pode até ser coincidência, mas que ela vê até nos exames da pessoa uma imunidade alta (se a pessoa está bem psicologicamente) ou baixa (se está carente ou deprimida). Então ela me disse que é muito comum - muito mais do que se imagina - que os parceiros (as) abandonem a mulher durante um tratamento de câncer de mama, que ela, e nem eu, entendemos porque isso acontece, mas que acontece muito.

O Diego voltou, ela foi acompanhar outros pacientes e eu fiquei pensando em tudo que tínhamos conversado. Olhei o meu amor ali do meu lado, quietinho, ouvindo músicas, quase cochilando e me senti extremamente grata por tê-lo na minha vida. Por reafirmar, no meio dessa confusão toda, que eu tenho ao meu lado uma das - senão a - pessoas mais lindas que eu já conheci. O que ele tem feito por mim é muito mais que cuidar, que apoiar e se dedicar. Ele tem me mostrado a cada dia que ter me casado com ele (20 dias depois de tê-lo beijado pela primeira vez) foi a escolha mais certa de toda a minha existência. Em 9 anos de casados eu já sabia bem da pessoa linda, íntegra, honrada e bondosa que ele é, mas eu não imaginava que ele fosse capaz de lidar com tanta sutileza e sabedoria com uma situação tão complicada quanto essa que estamos vivendo. Ele é a pessoa que verdadeiramente me conhece - com todos as minhas infinitas falhas, -, mas que me ama por quem eu sou. 

Meu marido ama também a minha essência e não apenas o meu corpo. Porque uma coisa é a pessoa te amparar, te apoiar e cuidar de você (isso qualquer pessoa boa que tenha empatia pode fazer). O que difere (e muito) é o marido continuar te olhando, te amando e te querendo exatamente como você é (ou como está temporariamente). É ver que nada, absolutamente nada, mudou entre nós. Isso é o que talvez me faz mais forte, me dá a coragem e determinação que estou tendo. A coisa mais linda que o Diego tem feito por mim é me mostrar a beleza (real) que eu nem sabia que tinha e estar me ajudando a fortalecer o meu amor próprio. 

Dessa vez a minha expectativa sobre mim foi pior do que a realidade. Eu achava que iria ser muito difícil me olhar no espelho, que seria deprimente e doloroso demais me ver sem meus cabelos ou sem um dos dos meus seios, mas o que realmente está acontecendo é que a cada dia, por mais esquisitona que eu esteja eu gosto mais e mais do que vejo no espelho.

Agora só faltam mais duas. Depois eu quero muito comemorar a vida e essas descobertas todas que tenho feito. Quero aproveitar cada segundo que tenho pela frente com o meu amor, meus filhos e as pessoas que hoje me são muito caras.

Ainda não sei o que me espera pela frente nesse ciclo. Já comecei com um sustinho, mas espero que eu me recupere tão bem e rápido como no ciclo passado. E desejo, com toda sinceridade, que cada pessoa possa ter ao seu lado alguém que lhe ame e lhe queira exatamente como você é. Um beijo carinhoso a todos que me seguem.

Imagem: Lytton Strachey, por Dora Carrington - 1916
Fotos: Diego Moreira E Adriana Mani